Piloto automático



                Levanta, banho, café da manhã, tarefas de casa, banho, trânsito, trabalho, mais trânsito, universidade, jantar, aula, trânsito outra vez, volta pra casa, banho, dorme. Aí amanhece e começa tudo de novo, 24h por dia, todos os dias.
                Quando foi que eu virei esse robô que sempre repete tudo da mesma forma todos os dias? Quando foi que eu parei de viver e passei apenas a sobreviver?
                A verdade é que tudo foi ficando meio preto e branco. A rotina foi se instalando e, no processo, foi roubando aos poucos a cor, o som e a beleza de tudo. Aliás, quando foi que eu caí nessa rotina sufocante que nem mesmo o inspirar mais profundo dá jeito?
                Quando foi que, ao me olhar no espelho, o que ele passou a me devolver foi o reflexo de um estranho com o olhar pesado e cansado, cabelos desgrenhados, lábios arqueados pra baixo e linhas retas em cada canto da boca, me fazendo parecer um tipo bizarro de marionete, um projeto-boneco de mim mesmo?
                 Os filmes no cinema são desinteressantes, o céu não é mais azul, o álcool não é estimulante, o coração não mais acelera no peito, as lágrimas não vertem mais, os sorrisos são tão pálidos quanto fantasmas e os sentimentos quase inexistentes.
                Quando foi que eu virei esse autômato que anda pelo mundo em piloto automático?
"E tudo foi desbotando até desaparecer."