Camping #2


Surpresa!

Na manhã daquela segunda-feira eu até que poderia ter acordado um pouquinho mais tarde pra ir para a escola, porém aquela velha rotina de acordar às 4 horas da manhã havia se tornado estranhamente confortável para mim.
Entretanto hoje seria um pouquinho diferente, afinal, seria o primeiro dia de aula e eu até que estava animado pra isso.
Totalmente desperto, preparei meu café antes que todos da casa acordassem e... Bem, não irei narrar esse ponto do meu dia porque... ah, só não quero.
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Eu estava lendo o exemplar de O Grande Gatsby que havia pegado na biblioteca antes do início das férias e ainda não pudera ter devolvido e nem terminado de ler por motivos de preguiça. Não que o livro não fosse bom, porque era e muito, mas eu simplesmente não tive cabeça pra terminar de ler o último capítulo.
Voltando, eu estava lendo quando escutei alguém chamar meu nome. Era a Alice, minha melhor amiga desde sempre.
Alice é uma das pessoas mais loucas e incríveis que já conheci. Ela tem a minha idade, uma pele levemente corada, uma personalidade quase completamente diferente da minha e longos cabelos azuis. Seus cabelos naturalmente são louros, mas ela não gosta muito e, por isso, pinta de diferentes cores frequentemente. O azul não lhe caía bem e eu já havia dito isso para ela.
- Ei, er... – bem, eu nunca fui um especialista em começar diálogos. Por isso era frequente começar qualquer conversa com um “ei, er...” completamente sem jeito. – Bom dia, eu acho.
- E aí – Alice bagunçou meus cabelos enquanto perguntava: - Como é que vai meu pseudoruivinho? Quando é que a gente vai trocar a cor desses cabelos? E as férias? Viajou pra algum lugar legal? Conheceu gente nova? Uma namoradinha?... – foi uma enxurrada de perguntas sem pausa e eu me perguntava como é que ela conseguia perguntar tantas coisas em um período de tempo tão curto e sem parar pra respirar.
- Primeiro: calma. – comecei a falar, concertando a zona de guerra que ela tinha feito na minha cabeça. – Segundo: eu to legal; terceiro: quando é que você vai trocar esse azul horrível? E quarto... Esqueci o resto das perguntas.
Ela sentou na minha frente empolgada e jogando sua bolsa bem longe e suspirou.
- Impressão minha ou essas férias passaram muito rápido?
- Impressão. – respondi. – Com toda a certeza, impressão.
- Já vi que alguém não se divertiu nada nessas férias.
- Nem... até que foi legal. É que eu só tava cansado de acordar cedo e não ter nada pra fazer depois. Mas e as tuas férias? – perguntei rapidamente. – Como foi lá na fazenda?
Ela suspirou de novo e se deitou no meu colo. Tive que guardar o livro na mochila.
- Foi um tédio só. – ela me respondeu. – Mas foi legal.
- Hã?! “Tédio” e “legal” não combinam na mesma frase.
- É que eu descobri que meu primo tem um amigo que é muito gato e... – ela fez uma cara que, pelos céus! – Ele beija muito bem!
Eu ri.
- Cara, prestar que é bom, nada né?
- Não. – ela respondeu tentando assumir uma expressão séria. – Mas e o acampamento com teus pais, como foi?
- Legal. Apesar dos mosquitos, mato e todo o mais.
- Conheceu alguém lá? Tinha alguma menininha bonita? Como ela era? Com...
- Alice! – interrompi a nova torrente de perguntas que estava prestes a se derramar sobre mim. – Não, não tinha nenhuma menininha bonita. Quer dizer, até tinha, mas não conheci nenhuma. Só... – me interrompi.
- Só...? – ela perguntou.
- Só conheci um garoto lá. Ian, se eu não me engano.
O assunto do acampamento morreu e nós dois conversamos bastante antes de a aula começar e termos que entrar no prédio sufocante da escola. O pessoal todo foi chegando e eu fui me sentindo cada vez mais sufocado por todas as perguntas de todos. Eu sempre detestei responder perguntas.
Fui ficando cada vez mais distraído conforme o dia foi passando e não foi nenhuma surpresa quando vi que as aulas haviam terminado por hoje. Surpresa foi o que, ou melhor “quem”, vi sentado quatro carteiras à frente da minha arrumando as coisas para sair da sala.
- Zac. – era Alice me chamando, acho que fiquei com cara de bobo ou coisa assim porque ela estava se esforçando pra esconder um sorriso. – Tá tudo bem?
- Er... oi?
- Vamos? – ela perguntou, soltando um riso rápido.
- Certo.
- O que foi?
- Nada, é que... Nada.
Alice e eu já estávamos saindo da sala quando o “nada” me aconteceu. A pessoa que vi sentado quatro carteiras à frente da minha era o Ian, o garoto do acampamento que, diga-se de passagem, Alice quis saber muito sobre e se eu tinha falado sobre ela em alguma de nossas “conversas nerds, sobre coisas nerds”.
- Zac? – ele chamou.
E lá estava ele. All stars maneiros, jeans surrado, a camisa do uniforme, óculos de armação legal sobre um par de olhos castanhos com olheiras e o cabelo negro bagunçado.
- Ei, er... – eu tinha que parar de começar uma conversa com esse estúpido “ei, er...”. – Ian...?
Alice virou pra mim com uma cara que dizia mais ou menos “não! Esse cara é o Ian?” e “Wow! Ele é, tipo, muito gato!” e também “Acho bom você ter falado de mim pra ele ou eu te mato!”
- Que coisa, quem diria que seríamos da mesma sala não é? – ele tinha se aproximado de nós dois em menos de um passo, acho. Estendeu a mão para mim, sorrindo. – Queria ter parado pra falar contigo ontem, mas eu tava meio atrasado pra chegar na igreja. Nisso que dá acordar tarde. – a propósito, eu apertei a mão dele. – Enfim, que coincidência, não mesmo?
- Er... Super! Então – acrescentei depois de alguns segundos de silêncio constrangedor. – Essa aqui é a Alice, lembra que eu te falei sobre ela no acampamento?
O sorriso dele cresceu. E o da Alice? Bem, só digamos que ela parecia o gato do País das Maravilhas.
- Claro que lembro – ele respondeu. – Como esquecer a famosa Alice?
- Famosa? – ela perguntou, colocando uma das mãos sobre o peito, claramente lisonjeada. – Nem tanto.
- Sim, famosa. – Ian insistiu. – Zac falava muito sobre você lá no acampamento. Mas ele disse que seu cabelo tinha uma cor horrível e... bem, eu particularmente achei muito bonito. Azul é minha cor favorita.
- Mesmo? Obrigada. – ela soltou um risinho meloso e jogou os cabelos para um lado. Ela estava definitivamente flertando com o cara. – É a cor favorita do Zac também, pintei por causa dele.
- Ele me contou isso também.
- Certo, gente. – me intrometi na conversa. -  Sem querer bancar o chato ou o bombeiro, mas tá ficando tarde e eu não quero ficar mais um minuto sequer aqui nessa sala. Com sua licença. – disse me virando para Alice e lhe fazendo uma mesura. Depois me virei para Ian e acrescentei: - Fico feliz por sermos da mesma sala. Até mais os dois.
Fui saindo.
- Chato. – Alice falou, me puxando pelo braço. – Espera que eu vou contigo. Bom – ela falou para Ian. – Te vejo amanhã.
E saímos da sala, deixando Ian para trás. Ele poderia ter vindo com a gente, mas por algum motivo não veio. Desconfio que tenha sido pela ausência de um convite vindo da minha parte.

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